"(...) Aconteceu há mil anos? Continua acontecendo. Nos mais desbotados panos Estou me lendo e relendo. (...)" - Carlos Drummond de Andrade, “O tempo é para sempre".
Para celebrar os 25 anos da Cia. Artesãos do Corpo, foi criado o espetáculo Antes do Presente, que ficou em cartaz de 29 de março a 14 de abril, no Complexo Cultural Funarte SP | Sala Renée Gumiel.
Como em um ritual, ajoelhados e com olhares contemplativos, os intérpretes da Cia. Artesãos do Corpo estão diante de seus territórios particulares de areia num desenho quase simétrico no palco.
Ao som do apito de bambu, iniciam suas escavações com movimentos lentos e cuidadosos. Em um tempo sem pressa, removem a poeira dos fragmentos desenterrados que parecem ser ossos, troncos de árvore ou cacos de alguma coisa. Ao tocá-los, observam suas características: textura, peso, cor, temperatura como se rastreassem os indícios dos afetos do passado no presente.
A imagem que ocupa o fundo do palco projeta a escultura, aparentemente feita de pedra, de um corpo que repousa entre plantas, e ilumina a cena de descobertas de memórias ainda ocultas.
Com direção de Mirtes Calheiros, que também atua como intérprete, o elenco é formado pelos performers Dawn Fleming, Ederson Lopes, Fany Froberville, Hiro Okita e Leandro Antonio, que têm diferentes idades e formações.
O fato de estarem juntos há muitos anos na companhia gerou uma contribuição significativa no processo de montagem de Antes do Presente. Segundo Mirtes, “A Arqueologia traz tempos longos, silêncios, mistérios e descobertas” e os estudos de temáticas nessa área são recorrentes para o grupo nos processos de novas produções. Além disso, ela ressaltou a importância da residência “Arqueologia do Sensível” que o elenco tem vivenciado há mais de dez anos com o performer Toshi Tanaka.
A pesquisa para a criação de Antes do Presente teve como ponto de partida a “Arqueologia dos Ossos”. Os intérpretes mexeram e remexeram as areias de suas próprias histórias de vida com objetos produzidos por eles mesmos. Foram escavações de recordações vividas, mas também de esquecimentos que os levaram a várias experiências como estímulos às propostas coreográficas e cênicas. E um dos maiores desafios era levar ao palco, a “dança dos ossos” e os apagamentos do passado no presente.
Sem a pretensão de dançar uma narrativa linear dos 25 anos da Cia. Artesãos de Corpo, as descobertas motivaram interpretações dos performers em solos, duplas e em grupo num tempo sem marcações. No decorrer do espetáculo, outras projeções de imagens de trabalhos anteriores e as citações de Bob Dylan, Patti Smith e Lee Ufan integram as memórias dançadas assim como a encantadora trilha sonora que acompanha cenas ímpares.
A dança das lembranças e das lacunas remexidas, provoca emoções e identificações de uma grandeza sem tamanho. Seja na cumplicidade romântica do tango a dois, seja no momento em que os paletós vazios são lançados ao chão pelo homem em desespero – sem respostas aos seus repetidos gritos de “Onde estão os ossos?” – seja na aparente alegria do homem que prepara a fotografia do casal. Ele veste o vestido vermelho, coloca os brincos e senta-se na cadeira dela, que com certeza não virá. Então veste o terno elegante para se posicionar em pé atrás dela, que com certeza nunca virá...
Ao compartilharem com o público as memórias revisitadas e recriadas no corpo pelos performers, elas ganham outra proporção no presente, viabilizando novas conexões para a longa trajetória da Cia. Artesãos do Corpo num tempo que é sempre.
Sobre a obra
Fonte: Release pela Assessoria de Imprensa, Nossa Senhora da Pauta. frederico@nossasenhoradapauta.com.br
Criada em 1999, pela socióloga e bailarina Mirtes Calheiros é formada por bailarinos, performers, atores e pesquisadores de artes cênicas, com o objetivo de elaborar espetáculos, intervenções, performances e projetos que provoquem a sensibilidade e a consciência do espectador para temas de interesse no mundo contemporâneo. Em 2024 a companhia celebra 25 anos de existência e segue na sua pesquisa sobre a diluição das fronteiras entre dança-teatro-performance e na investigação urbano-coreográfica dos processos de influência, alteração e diálogo entre o corpo e a cidade. Tendo como premissa a diversidade e a pluralidade na formação de seu elenco a companhia leva ao palco a cada novo trabalho um mosaico de referências estéticas e de percepções corporais distintas, criando inúmeras possibilidades coreográficas a cada tema proposto. Atualmente a companhia dedica-se a pesquisa de estados físicos e meditativos que estimulem o intérprete à criação cênico-coreográfica a partir de situações de presença e sua posterior ressignificação para a cena utilizando diferentes abordagens de treinamento e percepção corporais orientais (aikido, yoga, tai chi, chi kung, do-ho, sei-tai-ho). A Cia. Artesãos do Corpo já levou suas criações e performances para festivais e espaços culturais em diversos cidades brasileiras e para 8 países: Estados Unidos (George Washington University), França (Centro Cultural Japonês – Bertin Poureé), Bélgica e Alemanha (Danse en Ville), Portugal (Lugar à Dança, MUDE em Movimento e Extensão Visões Urbanas), Argentina (Festival Diagonales), Itália (Festival Ballo Pubblico), Festival Contemporâneo de Música e Costa Rica (Festival Algo Imagen).
Ficha Técnica
Fonte: Programa do espetáculo Antes do Presente. Cia. Artesãos do Corpo.
Direção: Mirtes Calheiros
Elenco: Dawn Fleming, Ederson Lopes, Fany Froberville, Hiro Okita, Leandro Antonio e Mirtes Calheiros
Pesquisa Musical e Sonoplastia: Marcelo Catelan
Luz: Carlos Gaucho
Figurino: Miko Hashimoto e acervo Cia. Artesãos do Corpo
Arte Gráfica: Bruno Pucci
Residência “Arqueologia do Sensível”: Toshi Tanaka
Fotos: Fabio Pazzini
Cerâmica: Beth Lima
Cenografia e Objetos: núcleo artístico Artesãos do Corpo
Registro em Vídeo: André Cruz - Captura Filmes
Audiodescrição: Ver com Palavras
Projeções-Vídeos: Ederson Lopes
Vídeo com esculturas: Mimmo Paladin
Citações: Bob Dylan, Patti Smith e Lee Ufan
Assessoria de Imprensa: Nossa Senhora da Pauta
Produção e Administração: Ederson Lopes
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